AO ATRAVESSAR A RUA, VEJO UMA BOLA
QUICANDO SOZINHA...
Ninguém a percebe, só eu e ela me segue. Fujo, mas, sempre me alcança.
Olho, ela está ao meu lado, sobe e desce. Dissimulo que não a percebo, só
que sabe que estou representando. Entro
por várias ruas e becos, quero a minha entediante paz novamente: acordar cedo
para trabalhar, quebrar a cabeça com os trabalhos chatos da faculdade, levar o
lixo até o começo da vila, ficar em casa porque não tenho dinheiro nem para
beber um refrigerante no shopping e ficar horas em pé num ônibus lotado. Entro num
sebo lugar para fugir. Uma funcionária, pergunta se estou me sentindo bem. Digo
que uma bola está atrás de mim e que poderia me achar louco, mas não agüento
mais esta situação. Ela diz: “ A bola quicando... estou vendo. Ela caça as
pessoas”. Pergunto se não tem uma solução. “ Tem que matá-la.”. Abaixa-se
para pegar algo no balcão e me dá uma espada de samurai. Agradeci e fui embora
com a arma na mão para resolver o embate. A noite na cidade parecia mais escura do que o
habitual. Ergui a espada. A bola para de pular e vem com toda a velocidade. Consigo
acertá-la, um estrondo ecoa por todos os cantos da cidade.
ACORDA COM O PRÓPRIO GRITO...
Acorda com o próprio grito, pensa na amiga. A angustia esmaga o peito, nem
espera amanhecer e sai de casa cedo. Olha o lugar onde a amiga a esperava e a
encontra lá quicando, a aflição se dissipa. Trabalha num sebo antigo e, ao ver
a colega de trabalho, pergunta se escutou o estrondo. Ela responde sim e olha
fixamente o outro lado da rua.
ANDAVA SOZINHA PELA RUA...
Quando encontra um rapaz apavorado porque uma bola o segue, deu para ele
a espada de samurai. Mas, quando vê a colega feliz e a bola pulando em frente
ao sebo, fica irada. Lembra-se de sua mãe pintora, que fez um quadro de uma
enorme bola. Uma vez, perguntou a mãe se a amava mais do que o quadro. A outra
disse: " Você filha" . " Então prove, queime o
quadro.". A mãe realizou sua vontade e nunca mais pintou, entretanto,
suicidou-se dias depois.
O dia seguiu normalmente, gostava de se emaranhar nos livros empoeirados
do Sebo, fazia esquecer temporariamente da " maldita bola".