segunda-feira, 31 de março de 2014

LEMBRANÇA ADORMECIDA


Em um dia de domingo, minha mãe resolveu preparar um bolo, que aprendeu num programa de tevê.  Quando comi o pedaço, lembrei-me de uma casa em que aparentemente nunca estive.

A lembrança estava coberta por uma tênue neblina. Comentei com minha mãe e ela ficou estranha. O gosto do bolo me despertou para algo, que não conseguia definir. Uma saudade inexplicável de um tempo que, talvez, nem existiu.

O tempo passou e os fragmentos começaram a surgir, como um riso de mulher, um cachorro lambendo um bebê e um homem de cara brabo e assustado. Também, garotas pouco mais velhas, chamavam-me de irmão.  As imagens eram comuns, mas me tiravam do eixo. Procurei até um analista. Meus pais se preocuparam comigo, já que eu passava horas em silêncio. As recordações se tornavam frequentes. De repente, não sabia mais quem era.

Então, contaram-me que fui sequestrado quando era muito novo por um casal. Meus pais e a polícia me procuraram por várias semanas.

Encontraram-me em um sítio, por causa de um telefonema anônimo. O casal havia desaparecido. Retornei para casa e as lembranças ficaram adormecidas até o dia em que comi o bolo. 


Por onde andam essas pessoas?

***
Em outra cidade, o casal recebia a visita do noivo de uma das filhas. Quando o rapaz viu a foto de um garoto pequeno, a mulher lhe disse:

- Esse era Davi, infelizmente, não está mais entre nós.

sábado, 29 de março de 2014

Sherazade

Imagem encontrada no google

Nasceu no subúrbio e teve este nome, porque sua mãe sonhou com terras estrangeiras e acordou com ele no pensamento.

Desde menina, Sherazade encantava a todos com suas histórias imaginativas.  Ela tinha fome de viver, aprender e viajava através dos livros, mas, tinha a sensação que já conhecia muitos lugares, como se tivesse vivido em outras eras.

Quando se tornou mulher, a família dizia que ela precisava casar e ter filhos, do contrário seria uma solteirona seca e mal amada. Sherazade teve com medo e para agradar a mãe, casou.

O marido não gostava das histórias dela e tinha ciúmes dos príncipes que viviam na imaginação da esposa. Sempre criticava suas histórias, dizendo que eram chatas. Já os filhos adoravam e pediam para ela escrevesse. Sherazade as produzia e escondia no armário.

Um dia, ao abrir o armário sentiu o vento e a areia no rosto. Sua alma ficou revolta. Fez as malas e pegou os manuscritos que produzira anos e foi embora de casa.

Sherazade sentiu o peso do mundo, mas resistiu. Queria ser uma contadora de histórias e viajou para todos os cantos as narrando. Passou muita necessidade, porém estava extasiada por fazer o que mais gostava.

Todos paravam para ouvi-la e davam força para que publicasse seus livros. Até uma jornalista e editora resolveu ajudá-la.  Sherazade produzia cada vez mais.

Anos se passaram, ela  ainda não  tinha se reconciliado com a família. Os filhos não perdoavam pelo abandono, um pai pode ser perdoado por isso, mas a mãe, nunca.  Escrevia cartas e mais cartas que nunca foram respondidas.

Uma vez, um dos filhos foi visitá-la e ela adorou conhecer os netos e contou várias histórias. Ficou tão feliz que morreu feliz. Quando entraram no quarto, viram o vento balançar as cortinas e a areia cobri-la.

***
Ao som 

Era - Looking for something


gatuno

sexta-feira, 28 de março de 2014

Apenas sonho

Imagem encontrada no  google

- Mamãe!
- O que foi?!
- Tive o mesmo sonho, que devorava todo mundo.
-  Calma, filho! É apenas sonho!
Abraçou-o e olhou para o marido que ocultava a punhal místico, o qual mata Fendas Famintas...
Dessa vez não precisavam fazer nada.

Por enquanto...

sábado, 22 de março de 2014

ENTRE EM CONTATO, JÁ!!!


Imagem encontrada no google

Hei! Você aí!

Quer ser respeitado?

Conseguir tudo que deseja?

Despertar o demolidor que existe em você?

Venha estudar em nossos estabelecimentos Torturadores S.A.

Aprenderá como torturar sem deixar marcas.

Como fazer manipulações mentais, para arrasar a mente do torturado.

O jeito certo de se livrar de um corpo sem deixar vestígios. 

Aprenderá técnicas de última geração, que arrancarão todos os segredos, até mesmo de uma rocha.

CINQUENTA ANOS DE SUCESSO, EFICIÊNCIA E DE PROFISSIONALISMO PERTO DE VOCÊ

***



moral da história de um gigante


Ilusão

Imagem encontrada no google

Uma jovem agradável veio falar comigo. Depois disse que precisava ir. Ao longe, gritou-me: " Me liga". Mas, não me deu o número.


sexta-feira, 21 de março de 2014

“PEGUEI”


Imagem encontrada no google


Ana tinha um amigo que tinha uma doença rara e terminal. Um dia, conversavam por mensagem instantânea na internet e ele lhe pediu para tirar a roupa, pois nunca uma moça se desnudou para ele. A jovem com pena ligou a webcam e se despiu para ele. A última coisa que o rapaz fez, em vida, foi espalhar nas redes sociais o vídeo de Ana nua, colocando um breve título: “Peguei.”.
A avó de Ana, uma senhora sábia, disse-lhe:


- Filha, não se desespere é mais forte que isso. Agora, tiramos uma lição deste fato tão odioso. Os canalhas já foram crianças, envelhecem e ainda podem ser doentes terminais. 

quinta-feira, 13 de março de 2014

- Filho!

Imagem encontra no google 


Por que não vai procurar alguma coisa pra fazer? Que saco, essa coisa de profundeza! O lance é ficar no raso pra não afundar, filho. Tenho tanta coisa pra fazer, enquanto você fica falando das profundezas da existência. Filho, você é um porre com isso. Profundeza da existência do ser é o caralho, eu ralo o dia inteiro pra manter o conforto aqui em casa, principalmente, pra você ficar à toa meditando sobre os pensamentos complexos e herméticos. Ainda por cima, fica com esse olhar de superioridade pra mim. Já que me critica tanto, por que não vai embora? Vai trabalhar, então! Quero ver se terá tempo de " filosofar" tanto. Não se acha tão bom? Odeio quando me despreza silenciosamente. O quê? Quer dinheiro pra ir ao cinema? Pega lá na gaveta. Vai ver um daqueles filmes esquisitos que você aprecia tanto, né? Cuidado, não vai chegar tarde! A rua está muito violenta. Pega mais dinheiro pro táxi.

terça-feira, 11 de março de 2014

Bala perdida




Passou de raspão no ouvido de Eduardo, dizendo:

- Oi, amigo! Já que não posso beija-lo na testa, um beijo na alma.

segunda-feira, 10 de março de 2014

vencido


Percebeu que o filho chegou derrotado, recepcionou-o sem perguntas. Ao passar do tempo, ia vê-lo no quarto e o encontrava, literalmente, em um casulo.

Um dia, quando varria a casa, ele apareceu tomado banho. Pediu um saco de lixo, para retirar do quarto a carcaça do casulo. Em seguida, disse que compraria jornal para ver emprego.

A mãe contente desejou-lhe sorte e ele sorriu brevemente vencido, porém com desejo de viver.

Estava prestes a voar novamente.

quinta-feira, 6 de março de 2014

GAROTO BOMBA


Imagem encontrada no google

 Descobriu-se homem através dos olhares vorazes dos mais velhos e percebeu que poderia ganhar vantagem por causa disso. Não era “prostituto profissional”, mas saia com senhoras e senhores ocasionalmente.

 Um dia, quando estava com um admirador de sua beleza viril, ganhou dele uma blusa e o jovem viu que não era de grife. Emergiu sentimentos conflitantes como desejo, repulsa, vergonha, culpa, perversão, ira e os quais foram um combustível para detonar uma bomba. 


Minutos depois, quando deu por si, sentiu suas mãos no pescoço do outro, que estava inerte e frio. Saiu do lugar rapidamente e foi viajar com os amigos e a namorada para uma cidade litorânea passar o carnaval.

Transformou seu crime em um sonho ruim que, às vezes, o atormentava no feriado.

quarta-feira, 5 de março de 2014

Oi, vizinho!!!!

“Preciso te contar o que me aconteceu. O que foi? Tá chateado? Você viu como as coisas estão caras no supermercado? Ontem, assisti um filme engraçado de um zumbi pegador. A Laura me ligou, nem te conto... Sabe a cachorra da vizinha? Morreu envenenada. Estou com dor de barriga. Porque naquele dia, você gritou comigo? Fiquei chateado. Espera! Preciso falar uma coisa séria... Viu como a rua está suja? Dizem que o lixeiro está em greve. Quero mudar para um lugar mais tranquilo... Amanhã, vou trabalhar! Poxa, esqueci o que tenho que falar pra você. Quando lembrar, te falo. Agora, preciso sair, tchau, vizinho!”

***

terça-feira, 4 de março de 2014

DIAGNÓSTICO

Imagens encontrada no google


- Senhor Eduardo, pelo que tudo indica nos exames, o senhor está sem ler há bastante tempo. Contraiu uma anemia de palavras e de imaginação. Seu caso é sério, recomendo que diariamente leia um livro, mas não precisa ser romances longos. Um conto ou uma poesia são nutritivos, também.

segunda-feira, 3 de março de 2014

EM PLENO CARNAVAL


CANSADO



- Está triste?


- Não, só não estou com vontade de rir e a boca fica dormente quando finjo toda hora um sorriso.

domingo, 2 de março de 2014

QUARTA-FEIRA DE CINZAS




- Não consigo tirar a fantasia, por que não sai? O pessoal aqui de casa diz que estou pirando, pois não estou fantasiado. Mas, estou sim. É uma fantasia grotesca, que nem consigo descrever.  Sai de mim!! Você não me pertence!! Sou um cara honesto e de família, não sou desse jeito. Pego a faca, mas o tecido é muito resistente, parece que é uma armadura. Quinta-feira irei trabalhar, como posso aparecer vestido deste jeito. Mesmo que ninguém perceba, ficarei sem concentração para trabalhar, vendo-me toda hora travestido em algo que não sou. Preciso dormir um pouco, quem sabe assim um milagre acontece.
***
Acordou e ouviu um barulho de mensagem do celular ao lado.
“ FUI!”
Levantou-se da cama e se olhou ao espelho.  A fantasia tinha ido embora, aparentemente.


BAILE DE CARNAVAL( conto antigo, quem já leu, passe batido)



Era tempo de carnaval. O dia estava muito quente; muitos mascarados pela rua faziam algazarra. A menina ia à matinê perto da casa da avó; estava fantasiada de Chapeuzinho Vermelho e carregava uma cesta de doce para avó e para os primos.
Quando se sentou no ônibus, apareceu um homem mascarado de lobo. Tinha uma camisa estampada e uns cordões grossos de ouro pendurados no pescoço peludo. Tirou a máscara e se sentou ao lado da garota. Começou a falar com ela:
– Oi, vai pro baile?
– Desculpa, a minha mãe falou que não posso falar com estranhos.
– Você se parece com uma menina que conheci. Ela era... Deixa pra lá. Essa cesta tem doces?
– Tem, qué um?
– Não. Olha, não precisa ter medo de mim. É que me lembrei de uma pessoa, quando a vi.
A menina lhe deu um doce. “Ele é bonito e forte...”, pensou. O homem gostou da guloseima. Antes de ir embora, disse para ela:
– Tchau, menina, divirta-se bastante.
– O senhor também.
Ele ia encontrar com os amigos. Tentava se divertir, mas não conseguia esquecer a dor de ter perdido a sua filha, naquele acidente...
Os amigos disseram que Glorinha iria encontrá-los no baile. Estava ansioso por recomeçar com a mulher. Deram um tempo, depois da morte da filha. 
Começou a rir, vendo a menina fantasiada ir à casa da avó, para brincar com os primos na matinê. 
“Quando crescer, essa menina vai ser de parar o trânsito...”.