SEGURAVA A PEQUENA MALA COM FORÇA...
E mesmo que não tivesse
muita coisa, Laura sentia orgulho ao carregar as fotos dos pais falecidos, da
tia que a criou com muita disciplina para ser tornar uma mulher de bem, os
livros de pedagogia e a bíblia. Era professora e havia recebido uma proposta de
emprego para ser governanta.
Laura teve um breve
arrepio, quando chegou à mansão centenária, mas, manteve a postura severa ao se
apresentar aos empregados e ao seu futuro aluno, Antônio, um rapaz pálido de quatorze
anos.
Laura achou-o estranho,
um menino com postura de homem maduro. Os primeiros dias foram tranquilos,
Antônio parecia ser muito educado. Entretanto, um dia, ele falou sobre a antiga
governanta que havia se suicidado. Contou que havia boatos sobre o desespero
por estar grávida. Laura não entendeu, inclusive, a malícia quando ele disse
que a moça só vivia na mansão e nunca fora vista com ninguém.
Depois, Antônio lhe deu um livro com recomendação
enfática para que o lesse. Laura só lia livros da área de educação e ao pegar o
aquele considerou o título estranho: A VOLTA DO PARAFUSO. Considerou o título
estranho e até pesquisou sobre seu significado. Além das informações sobre a
obra literária, descobriu que havia muitas adaptações da história para o
cinema.
Os momentos, antes serenos, se tornaram opressores. Laura à medida que lia o
livro percebia que aconteciam situações semelhantes. O título
do livro começou a ficar claro para ela. A expressão "dar uma volta no
parafuso ou em parafusos" refere-se ajustar uma máquina - ou um
instrumento de tortura - de modo que ela opere de forma mais rápida ou mais
eficaz. Figurativamente, a frase refere-se a fazer algo mais intenso ou
doloroso. Realmente, à medida que a narrativa do romance se aprofundava, Laura
passava por este processo, principalmente, por se sentir impotente para salvar
Antônio de algo que não sabia direito.
Tinha a impressão de que a história era
um espelho. Ela e a governanta do romance eram a mesma pessoa. Antônio
tornava-se cada vez mais estranho e sedutor. Tocava Laura de leve e a olhava
fixamente. Questionou sobre a mansão ser assombrada, já que quando o sol mudava
de posição, a luz e as sombras dos recintos produziam formas melancólicas e
sugestivas. Pensou na antiga governanta e em quem a teria engravidado
realmente. Perguntou aos antigos empregados que respondiam por meias palavras e
se esquivavam apressados.
Uma vez, sentiu alguém beijá-la na alta madrugada, mas só viu um vulto
na esquina do corredor. Será que aconteceu ou foi fruto da sua imaginação? Em uma tarde,
flagrou uma jovem emprega a sair apressada do quarto de Antônio e ela estava
meio decomposta. Quando Laura entrou no aposento, o
rapaz estava a ouvir música e a torturar uma borboleta, colocou-a em um
recipiente sem oxigênio e assistiu prazerosamente ao inseto agonizar. Às
vezes, quando nadava na piscina, sorria-lhe e Laura incomodava-se e se refugiava
nos ensinamentos da tia.
Devorava o livro e, depois de terminá-lo, concluiu que deveria salvar Antônio,
que parecia estar sendo dominado pela historia da antiga governanta. Decidiu
confrontá-lo. Antônio riu dela e disse ser tudo fruto da imaginação de uma
solteirona que não conhecera nada da vida. Laura foi arrumar suas coisas para
ir-se. De repente, sentiu uma presença e viu um vulto de mulher na janela.
Quase gritou, mas manteve a calma.
O taxi que tinha chamado
já estava à espera. Dias depois, na casa da tia, viu no noticiário que a mansão
pegara fogo inexplicavelmente, matando Antônio que não conseguira fugir. Ficou
perplexa e triste por não poder salvar o menino.
Quando foi ao quarto,
encontrou o livro sobre a cama e a foto queimada de Antônio.