- Muitas vezes, não consigo escolher as palavras certas. Quero dizer como me sinto, mas, elas ficam
embaralhadas na minha frente e não consigo pescá-las. Tentarei lhe explicar...
Há fronteiras que a gente não pode ultrapassar, pois, não tem como voltar atrás. Está entendendo? Quando me deparo com estes limites, tenho
medo de deixar de ser eu e me tornar outro ao atravessá-los. Ao mesmo tempo,
que sinto medo, surge certa curiosidade. Porém, se eu quiser voltar e não puder
mais? Já que o mundo que conhecia não existirá mais. Até quando sou prudente ou
covarde? Você já ultrapassou suas fronteiras, ainda continua sendo você? Sei
que isto é meio confuso, nunca consegui explicar o que acontece comigo. Talvez,
estas fronteiras sejam minha humanidade. Em alguns momentos, imagino-me fazer
uma crueldade com um bicho, por exemplo, colocar um gatinho no microondas... A culpa
vem galopante ao pensar sobre isto. Deve estar me achando louco, né? É que fico
transbordando com tantos pensamentos que preciso colocar um pouco para fora. Tenho
tanta ira, às vezes. Chega! Você é um cara legal, não lançou, para mim, nenhum
olhar de censura. Não sei o que me deu, nunca disse a ninguém o que lhe
confessei. Sei lá, o dia está estranho. Amanhã será outro dia, até mais. Boa
noite, vizinho.
***
O vizinho nem prestou a atenção nele. Estava mais preocupado em se livrar do corpo da amante, antes de sua noiva voltar de viagem.