segunda-feira, 23 de abril de 2018

LENA




- Lena?
-Vô, é um manequim de loja.
- Não estou enxergando bem. De longe, parece Lena.
- Quem é Lena, vô?
- Foi mais uma pessoa querida que perdi por aí.

sábado, 21 de abril de 2018

MÁSCARA-OBJETO






Não acredito, não pode ser. Deixei minha máscara em casa. Por isso, que estão me olhando estranho. Estão me vendo como sou realmente. Olham-me assustados, com desprezo e ódio. Como isto pôde acontecer? Sou o único sem máscara que anda pela rua. Nunca a esqueci, vivo com ela  grudada em mim, no banho, principalmente. Mas, hoje, tudo foi bastante estranho. Acordei super atrasado.Pulei da cama e me arrumei  correndo, nem tomei banho. Isto nunca aconteceu comigo... Estou completamente exposto, parece que os transeuntes estão tendo acesso aos meus pensamentos mais profundos. Preciso voltar e pegar minha máscara. Estou com tanto medo, que não consigo me mover, além, de parecer uma gelatina de tanta tremedeira. Não gosto desta sensação de fragilidade, quando uso a máscara, ficou no controle. Uma criança me aponta e diz para mãe: " Aquele homem está sem máscara, ele é maluco, mamãe?". Não, eu não sou doido, só esqueci de colocá-la. Será que irão me enfiar numa camisa de força? Sou um bom cidadão que trabalha, que paga imposto, só cometi o deslize de esquecer minha máscara em casa. Ninguém  percebe que ainda sou uma pessoa? Parece me veem como uma coisa amórfica. Tenho que fugir! Espera, lembro-me que meu avô me disse que  dentro da gente há uma coleção de máscaras. Não precisamos da máscara-objeto para representar nosso papel.  Bem, todos diziam que o vô era caduco. Mas, não custa tentar. Ele disse que precisa se concentrar muito. Vamos lá... Cadê vocês? Só vejo escuridão, preciso relaxar. De repente, a cidade se cala e o silêncio se comunica comigo. Começo ver várias máscaras. Com pode existir tantas dentro de mim? Vou escolher uma, peguei! Tudo volta ao normal. As pessoas não me olham mais. Sou mais um mascarado na multidão, que bom. A vida que segue. Quando voltar para casa, jogarei a mascara-objeto fora, não preciso mais dela.

domingo, 8 de abril de 2018

MIRAGEM


Imagem encontrada no google


“Homem preso”...  “O número  de  vítimas  aumenta  vertiginosamente”...    Pedófilo  desgraçado!!”...  “ Entregou-se depois de fugir  para  fora do  país”...

Todos os dias, Sofia ouvia a enxurrada de notícias.  Mas, ainda achava que estava sonhando.  Vizinhos de mais de quarenta anos viravam-lhe a cara e até destruíram o  seu pequeno  jardim, o qual  ela  e seu marido cuidavam  com  bastante zelo.

Perguntava-se por qual motivo Alfredo fez tantas coisas ruins.  Era tão cuidadoso com ela e amoroso.  Aquelas meninas tinham até idade de suas netas.
 Antes, todos admiravam e  invejavam  o  casamento de Sofia com Alfredo.  Sempre sorridentes e nunca brigavam.  Sentia-se plena,  com  um  marido  que a  cercava de  mimos.      

   Porém, quando tudo foi revelado,  Sofia  teve a  sensação que toda sua vida foi uma mentira. Pôs a boca no  travesseiro e gritou,  sentia uma dor física.

De repente, a porta se abriu  e  sua netinha correu para ela  e lhe deu  um desenho.  Sofia olhou a  neta,  que lhe sorri. Compreendeu estar errada,  sua trajetória  não foi  somente  miragem.  Entendeu que  possuía  uma  família  de  verdade. Relembrou os momentos felizes  e  não  se  sentiu  mais vazia. 

Finalmente, conseguiu levantar da  cama. Abriu as  janelas,  a vida  lá fora continuava em movimento.  Seguiu  os sons  que  vinham  da sala.

Todos estavam  lá,  esperando-a.  Emocionou-se,  nem  tudo  foi falso.       


Barriga errante( conto antigo)




Essa é a história da minha barriga.
Deseja a liberdade plena. Revolta-se, quando coloco o cinto na calça. Sente-se estrangulada e se estufa ao máximo, até ceder o cinto.
Ela quer ser dona dela mesma. Eu a reprimo.
Gosto dela, porém, não posso permitir, que ela se revolte contra mim.
Tento dominá-la. Ela resiste. É uma guerra silenciosa e cruel.
A paz dessa batalha, talvez, só irá acontecer, quando nós dois morrermos.
Ou não, nossos espíritos continuarão a lutar.