Quando nasceu, a mãe pereceu e as
flores murcharam. Diziam que era maldita, mas, a velha empregada não desistiu
da menina.
Cuidava dela com luva, máscara e percebeu
que apesar da criança ser tóxica, o seu
olhar transbordava amor. O tempo passou, o bebê tornou-se uma jovem
"feinha", entretanto, era muito caridosa com todos, para não
envenenar ninguém. Lembrava-se de cada morte de bichinhos, que tocou por
curiosidade quando pequena.
À medida que seu amor aumentava,
sentia que se tornava mais tóxica. Por isso, colocava roupas e luvas
impermeáveis e dormia num quarto especial, o qual protegia o mundo de seu
veneno. Aonde ia, os habitantes acostumaram-se ao vê-la travestida
de astronauta.
Habituara-se à solidão e a achava
necessária, assim, ninguém se machucava. Ajudar a todos se tornou sua
alegria e compartilhava seus sentimentos com a velha empregada que a salvou do
medo e da ignorância humana.
Começou a pensar como poderia morrer
em paz, sem contaminar o ambiente. Decidiu fazer uma manta especial e deu
orientações para a senhora cuidar de seus restos mortais. Torcia falecer
primeiro, só confiava em sua "bá" para fazer o serviço.
Anos se passaram e as duas estavam
cada vez mais unidas. Quando a velha empregada estava muito doente, pediu-lhe
para tirar a máscara e lhe dar um beijo na testa. Disse para confiar nela. A
outra sentiu medo, porém, cedeu ao pedido.
Ao tirar o capacete entrou, pela
primeira vez, em muitos anos, em contato como o mundo e se sentiu desprotegida.
Beijou a empregada que fora sua mãe. Percebeu que a senhora não passou mal
e que nada morreu ao seu redor. Estava curada.
Então, percebeu o sacrifício que sua “bá”
fez, chorando de tristeza e alegria. Agora, entendia o porquê de a senhora
rezar baixinho por horas a fio em todos os recantos da casa. Apesar de usufruir
a liberdade, sentia culpa.
Precisou de certo tempo para
assimilar sentimentos tão conflitantes.